sábado, 30 de abril de 2016

Noturno


Noturno

Devagar, devagar... A noite dorme
e é preciso acordar sem sobressalto.
Sob um manto de sombra, denso, informe,
o mar adormeceu a sonhar alto.

Devagar, devagar... O rio dorme
sobre um leito de areias e basalto...
Malhada pela neve a serra enorme
parece um tigre a preparar o salto.

E dorme o vale em flor. Dormem as casas.
Nenhum rumor. Nenhum frêmito de asas.
Nada perturba a noite bela e calma.

E dormem os rosais, dormem os cravos...
Dormem abelhas sobre o mel dos favos
e dorme, na minha alma, a tua alma.

Fernanda de Castro


Quem és tu?



Quem és tu?

Quem és tu que assim vens pela noite adiante,
Pisando o luar branco dos caminhos,
Sob o rumor das folhas inspiradas?

A perfeição nasce do eco dos teus passos,
E a tua presença acorda a plenitude
A que as coisas tinham sido destinadas.

A história da noite é o gesto dos teus braços,
O ardor do vento a tua juventude,
E o teu andar é a beleza das estradas.

Sophia de Mello Breyner Andresen



sábado, 23 de abril de 2016

23 de Abril - Dia Mundial do Livro


Falando de Livros

O livro é a casa
onde se descansa
do mundo

O livro é a casa
do tempo
é a casa de tudo

Mar e rio
no mesmo fio
água doce e salgada

O livro é onde
a gente se esconde
em gruta encantada.

Roseana Murray


quinta-feira, 14 de abril de 2016

Os rios começam a dormir


Rios começam a dormir, pela orla.
Um dom de entardecer percorre as águas.
Nas entranhas dessas lagoas
os sapos tocam violas
a quinze metros do arco-íris
o sol é cheiroso
A ciência ainda não pode
provar o contrário.

Manoel de Barros



Sabastião


Sabastião

Todos eram iguais perante a lua
Menos só Sabastião, 
mas era diz-que louco daí pra fora
— Jacaré no seco anda? 
— preguntava.

Meu amigo Sabastião
Um pouco louco
Corria divinamente de jacaré. 
Tinha um que era da sela dele somentes
E estranhava as pessoas.

Naquele jacaré ele apostava corrida 
com qualquer peixe
Que esse Sabastião era ordinário!

Desencostado da terra
Sabastião
Meu amigo
Um pouco louco.

Manoel de Barros